Quando uma empresa decide abrir seu capital significa, em tese, que se alinhou ao padrão internacional de gestão, se organizou para dar transparência às suas ações administrativas, tem faturamento compatível ou potencial para ascender no mercado, mas precisa de recursos extras para alavancar novos projetos, intensificar os que estão em andamento e até adquirir outras empresas. Demonstra também que está disposta a arcar com os custos desse processo (jurídico, contábil e de marketing) e de correr riscos junto aos novos acionistas.
O mercado de ações, por sua vez, permeado por especialistas, receberá as apostas de fundos de investimento e individuais que aceitaram o desafio da nova empresa a partir da análise dos dados apresentados pela ingressante (prospecto), dos aspectos conjunturais, das demais opções de investimento disponíveis no mercado, além da disposição emocional se houver necessidade de espera para a valorização do papel.
A palavra transparência, por sinal, tem muito peso nesse momento. O receio de se expor tem impedido a abertura de capital de muitas empresas grandes, com potencial de sucesso no lançamento do IPO – Oferta Pública Inicial. Ao optar por manter certas informações sobre o negócio em sigilo, contrariam as exigências legais das S.A., mas significa também que tomaram uma decisão estratégica de não se tornarem empresas públicas. Essa decisão varia de setor para setor, do estágio da empresa e de como foi feito o arranjo societário.
Pequenas
Bolsa de valores é entendida no Brasil, inclusive por muitos empresários, como lugar de “peixe graúdo”. De fato, a falta de cultura para explorar esse mecanismo de capitalização e expansão global pode levar automaticamente a essa conclusão simplificada. Tanto é assim que o Ministério da Fazenda vem pensando alternativas para popularizar as bolsas de valores criando mecanismos que facilitem o ingresso de pequenas e médias empresas nos pregões da Bovespa e BVRJ, por exemplo, agrupando-as em pacotes, talvez, para comporem no conjunto as exigências legais.
O receio é que não haja compradores suficientes e a boa intenção resulte em frustração. O próprio governo não encontrou ainda uma equação que reduza esse risco e reverta o quadro de incertezas. Pensa-se, por exemplo, na isenção de IR para os acionistas, entre outras medidas. Mas o momento é de estudos.
Riscos
O básico para quem investe em ações é que não existe garantia alguma de retorno do valor aplicado e muito menos se terá lucro. Porque se trata de aposta. Em caso de empreendimentos bem sucedidos, as ações tendem a valorizar e o retorno aos seus investidores pode ser muito satisfatório, como também pode ser o inverso e as ações despencarem, resultando em um imenso prejuízo.
Claro que nesse momento, de oscilação, tem os que vendem e os que compram. Ação com valor em baixa, mas com potencial, pode atrair novos investidores no exato momento em que estiver sendo vendida. Como pode também se desvalorizar completamente e perder a atratividade. A volatilidade faz parte do jogo e todos devem saber disso.
As empresas quando alcançam a condição de lançar IPO é porque podem ser devidamente estudadas pelos investidores antes do desembolso de risco. Passaram a ser reguladas pela Comissão de Valores Monetários (CVM), possuem Governança Corporativa e Conselho de Administração. Foram devidamente analisadas por corretoras especializadas (underwriters) na fase preparatória do IPO, gerido por bancos de investimentos reconhecidos. Ou seja, fizeram os ajustes necessários antes da aventura, o que dá certa previsibilidade.
Essa regulamentação permite que o mercado possa dimensionar melhor se a fase em que a empresa se encontra é de alta, de estagnação ou de baixa, o que faz com que os valores das suas ações subam, se estabilizem ou desçam, influenciando na intensidade e na qualidade das apostas. Se o setor estiver em evidência por bons motivos as apostas tendem a aumentar automaticamente.
Exatamente para minimizar riscos excessivos, reduzir ações sem lastro de empresas aventureiras e tentar evitar manipulações criminosas há o rigor pela transparência na apresentação do empreendimento ao grande público e das regras de regulamentação do processo.
No caso das empresas de tecnologia, informática, biotecnologia ou de comércio eletrônico, que operam na Nasdaq, o nível de tolerância é maior. Aceitam-se pequenas e médias empresas desde que apresentem ideias inovadoras e com potencial para convencer os investidores. Mesmo assim as regras para o interessado nesse mercado aberto de capitalização são rigorosas.
Preparativo
Portanto, o primeiro passo da empresa que se interessa em se abrir para o mercado é procurar um banco de investimento especializado que vai dar o aval à interessada (underwriter). Ela passará por avaliação. Terá de apresentar todos os números que comprovem seu desempenho, devidamente documentados, por um prazo que demonstre sua solidez e potencial de crescimento. Essas informações tornarão públicas. Será agendado o lançamento das ações, com base em um prospecto e a sorte está lançada.
Mas este é apenas o começo, já que a empresa se tornará muito mais vulnerável às oscilações do sistema econômico. Por isso precisará ser gerida com rigor e por especialistas. O comando sofrerá interferência externa, já que no caso das ações ordinárias os acionistas poderão participar das assembleias do Conselho Administrativo e votar. Nesse sentido, o empresário terá que estar culturalmente sintonizado com esta nova realidade para não sofrer com a dinâmica de uma empresa globalizada, como sua empresa acabou de se tornar. Esta visão deve estar consolidada internamente pelo menos seis meses antes do lançamento do IPO.
Caminhos
A orientação para se preparar ao IPO varia nos detalhes, dependendo da corretora, que tem estratégia específica, mas segue uma base. Pelo menos dois anos antes a empresa tem de estar em dia com todos os quesitos relacionados à qualidade e desempenho: estratégia, iniciativas, aquisições, equipe-chave, sistemas de controle etc.
Um ano antes, todos os demonstrativos financeiros e técnicos devem estar alinhados, os comitês para avaliação dos protocolos compostos, regidos por um sistema padrão de gerenciamento de informações e gestão empresarial. Com seis meses de antecedência, os quesitos relacionados ao IPO devem estar resolvidos, considerando as regras do CVM e da BM&F Bovespa, se for o caso, com a documentação que dá garantia ao lançamento assinada, selando a decisão.
Feito o lançamento, o mês seguinte deve ser dedicado à confirmação de tudo o que havia sido apresentado ao público, evidenciando ao mercado que as metas estão sendo rigorosamente cumpridas, para tranquilidade dos investidores.